segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

ACASOS E UM GRITO



Acasos e um grito
Há um vazio em cada esquina. 

Portas fechadas,
rostos nas janelas,
olhares enviesados, 
ecos das risadas de ontem...

Nossos olhos já não veem o céu.
A poluição não nos deixa vê-lo.

Nosso olfato não sente, senão,
o cheiro de óleo.

As flores não sobreviveram...

E o futuro se adianta... 



O gato se acomoda e sonha. 
A menina olha o futuro na tela da TV.
Alguém tricota um cachecol. 
Um tiro na noite!

Nossa boca não degusta, senão,
pobre guarida.

Não satisfaz. 

Enche.

Nossos sonhos:
montanhas íngremes...
picos escarlates... 
pontos inatingíveis.

Enquanto houver:
quem veja e se cale,
quem fale e se canse,
e, ao se cansar se esqueça.
Da criança com fome.
Do amor sem guarida.
Da criança sem teto.
Do amor com fronteira.
Do ventre estéril...

E o futuro se adianta... 

Um grito.


Não houve um grito de alerta!

Um grito, 
só.

Um grito, 
simples.

É triste precisar
haver um grito.

Um grito, 
não um sussurro!

Um grito com eco e tudo!!!

E o futuro se adianta... 

Um grito
das entranhas embriagadas de cachaça.

Único remédio do pobre... 
a cachaça.

Para esconder nesta máscara... 
a cachaça.

A dor de ver o filho,
sem pão e agasalho.

O teto caindo.
O fogão sem gás.

A mulher cuja beleza,
se a tinha, morreu nos partos.

E o futuro se adianta... 

Um grito de lamento:
quem tem nas mãos a decisão
só tem para dizer, 
"cada um vive como pode"
e diz na televisão. 

Ah! Meu D’us, 
essa não!

E o futuro se adianta... 

Um grito de desabafo,
no coro do estádio,
ao ver o juiz roubar,
no tempo, 
no pênalti,
na expulsão.

E o futuro se adianta... 

Um grito ansioso,
triste-alegre
alegre-triste.

E o futuro se adianta
não espera e não gera, 
apenas passa por nós arrastando seus 
felpudos chinelos de quarto...

Até quando assistiremos inertes?



Romero Bittar


(multiplicação com o poema Acasos de Luciah Lopez)

http://www.talentos.wiki.br/post.php?id=79798


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